sábado, 2 de março de 2013

A sarça ardente e a santidade do planeta




A mensagem ambiental de muitos textos do Antigo e do Novo Testamento fica mais evidente quando a leitura se realiza a luz da teologia da criação contida no livro de Gênesis. (ver “A missão dos cristãos nos desafios ambientais”).
Um desses textos é o episódio da sarça ardente narrado no livro do êxodo (Ex 3,1-5). A interpretação habitual dessa leitura está sob a ótica da manifestação do poder de Deus e da afirmação de sua santidade, atributos necessários para encorajar Moisés a assumir o desafio de liderar seu povo na missão que está prestes a receber. Nessa releitura transparece que o cuidado com o meio ambiente integra desde o início a missão de libertação do Povo de Deus. O relato se inicia assim:
Apascentava Moisés o rebanho de Jetro, seu sogro, sacerdote de Madiã. Conduziu as ovelhas para além do deserto e chegou ao Horeb, a montanha de Deus.*
A travessia do deserto é uma simbologia indicativa de que a rotina de Moisés está para ser quebrada. Na base dessa decisão provavelmente estava a escassez de comida, água e a esperança visionária de que além do deserto haveria uma situação melhor. Foi uma atitude ousada e de grande coragem porque se nada encontrasse, Moisés e seu rebanho poderiam ficar sem forças para retornar. Como motivação Moisés tem diante de si a montanha de Deus e assim sua decisão se caracteriza também como um testemunho de fé e entrega total aos desígnios de Deus. Essa experiência de conduzir as ovelhas pelo deserto foi ainda um anuncio e um importante treinamento para a travessia do povo de Deus que seria liderada por ele. Foi nesse contexto e ambiente extremo onde a vida experimenta seus limites que Moisés presenciou a manifestação de Deus.
O anjo de Iahweh lhe apareceu numa chama de fogo, do meio de uma sarça. Moisé olhou, e eis que a sarça ardia no fogo, e a sarça não se consumia.
Nessa manifestação Deus se manifestou a Moisés utilizando-se de dois elementos naturais, o fogo e a sarça. O fogo é um símbolo teofanico que desde as épocas mais remotas está associada à manifestação da presença de Deus e a sarça é, por dedução, um espécime da flora local. A forma como a manifestação de Deus ocorreu é bastante educativa, Ele utilizou um elemento da natureza (sarça) para realizar o sinal de sua manifestação (fogo) mas realizou esse evento sem consumir a sarça, assim evidenciou que Ele não é um consumidor da natureza e mostrou para Moisés que ao utilizar os elementos naturais não deve consumí-los, destruí-los ou esgotá-los. Moisés, porém não compreendeu essas coisas imediatamente, em princípio parece não percebido o fenômeno como uma manifestação divina mas apenas como algo misterioso:

“Então disse Moisés “Darei uma volta e verei este fenômeno estranho; verei porque a sarça não se consome”

O mistério que despertou a curiosidade de Moisés realizou o propósito divino, fez com que ele se aproximasse de Deus.

Viu Iahweh que ele deu uma volta para ver. E Deus o chamou do meio da sarça. Disse: “Moisés, Moisés.” Este respondeu: “Eis-me aqui.”

Quando Moisés chegou perto o suficiente Deus se manifesta de forma mais familiar e convincente, chamando-o pelo nome. Moisés compreendeu subitamente o que estava ocorrendo e, consciente da presença de Deus, respondeu colocando-se humildemente a disposição. O que Deus fala em seguida é ambientalmente muito impactante:

Ele disse: “Não te aproximes daqui; tira as sandálias dos pés porque o lugar em que estás é uma terra santa.”

Tirar as sandálias é atitude de reverencia e respeito diante de alguém que se considera sublime. Mas Deus não pediu esta atitude de reverencia e respeito para si, e sim para a terra. Certamente Deus já sabia o quão respeitoso Moisés seria para com Ele, por isso pediu a Moisés para reconhecer a santidade da terra e pautar sua relação com a ela com o mesmo respeito, carinho e cuidado que Lhe dedicava.
Todo esse cuidado com a terra (e com a sarça) é importante porque se trata de realizar a primeira missão que Deus confiou ao Homem no relato javista da criação e também porque será útil para retirar do deserto todos os víveres necessários para a grande travessia do povo. Assim, o sentido da palavra terra neste episódio assume o sentido de crosta terrestre, ambiente comum onde as montanhas se apóiam, o mar se agita, os rios escoam, os vegetais germinam e crescem, a vida se diversifica e a sociedade humana se desenvolve. Sob esta ótica, a santidade da terra pisada por Moisés se estendeu para todo o planeta e a missão salvifica do povo de Deus agora  inclui todos os cuidados que se deve ter com a Terra.

* Todas as citações foram extraídas da versão impressa da Bíblia de Jerusalém.

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